sexta-feira, 6 de maio de 2011

Barack Osama x Obama Bin Laden

A natureza, mesmo sendo por vezes cruel, é mais sábia do que supõe nossa vã filosofia. Talvez tenha sido a partir desse tipo de pensamento que James Cameron criou as bases de sua obra “Avatar”, onde o planeta onde se desenrola a trama tem consciência própria e demonstra isso.
Talvez a Terra, mesmo de forma mais discreta, não seja muito diferente. Há alguns anos assisti a um impressionante documentário, onde uma espécie de formiga conseguiu amplo domínio sobre vasta região, eliminando do território qualquer outro tipo de inseto que viesse a representar concorrência biológica. Os “donos do pedaço” acabaram sendo alvos de uma mortal e bizarra epidemia: simplesmente, uma espécie de erva ou fungo brotava de dentro para fora do corpo das formiguinhas levando-as à morte. A praga foi tão forte, que a população dos insetos desabou, permitindo o restabelecimento da diversidade da fauna do local.
Aparentemente, a inteligência biológica do planeta Terra impede a consolidação de domínios absolutos de espécies.
Até certo ponto, o ser humano tem pervertido essa regra por meio dos antibióticos e outros produtos da indústria farmacêutica. Mas há sutilezas que têm se mostrado intransponíveis. E uma delas é que o domínio absoluto de uma civilização sobre as demais é algo verdadeiramente inalcançável.
Os antigos egípcios, chineses, gregos, romanos, astecas e ingleses, cada qual ao seu tempo, provaram o amargo remédio do declínio de suas civilizações, após atingirem um patamar de domínio do mundo conhecido aparentemente inabalável.
O último país a tentar chamar para si a prerrogativa do domínio bélico global foram os EUA. Com a derrocada da União Soviética na guerra fria, durante alguns anos pareceu que os norte-americanos iriam se consolidar como o condutor da civilização humana.
Isso não estava acontecendo de forma escancaradamente despótica. Entretanto, sempre que possível, o governo daquele país arrumava uma forma de mostrar o seu poder aparentemente inalcançável. Mas a verdade é que a sensação de poder absoluto torna qualquer um meio presunçoso e conseqüentemente descuidado com a posição conquistada.
E dentro dessa dinâmica, os pretensos novos donos do mundo cometeram dois erros imperdoáveis: em primeiro lugar, abriram mão da segurança estratégica de produzir riqueza em seu próprio território, ao exportar suas indústrias e empregos para a China – que por coincidência ou não acabou se consolidando como principal contraponto geopolítico. Porém, o mais grave foi o arrogante desprezo aos hábitos, costumes e preceitos de outras civilizações que resistiam à sedução “American Way of Life”. Isso ocorreu especialmente nos oito anos de governo do George Bush Júnior, quando os então simpáticos defensores da liberdade externavam crescente truculência e desprezo a povos que não partilhavam de seus ícones éticos e religiosos. A antipatia ao “Grande Irmão” aumentou e o anti-americanismo passou a tomar vulto crescente e cada vez menos velado.
E a mistura de descuido e gabolice acabaram facilitando o encontro de brechas na couraça de quem se considerava inatacável. Daí, mais de três mil inocentes acabaram pagando com a vida pela falta de preparo de seus próprios governantes em compreender o mundo que presumivelmente dominavam.
Falo dos lamentáveis atentados de 11 de setembro de 2001. Nada justifica moralmente a barbárie concretizada por Osama Bin Laden e seus fundamentalistas. Mas também seria ingenuidade deixar de reconhecer que o Estado norte-americano estava se colocando em posição passível de receber uns beliscões nas nádegas. E para agravar a situação, a resposta militar no Afeganistão e a falta de capacidade de controle na consolidação da dominação do Iraque escancararam a percepção de que os EUA estavam era cantando de galo em relação ao seu poderio absoluto.  
Ainda mais: a sobrevivência de Bin Laden na ribalta da mídia mundial transformaram o competente marketing do “gigante poderoso”  em algo parecido com aqueles moleques grandões da escola primária, mas meio bobalhões.   E quem vê sua própria respeitabilidade desabar tem que penar muito para recuperar o status antigo, tendo insucesso na maioria das vezes. Isso também explica, em parte, a decadência da economia norte-americana na última década, onde foi contabilizado o custo de uma política externa desastrosa.
A eleição de Barack Obama teve a clara conotação de correção de rota. O estilo texano valentão e truculento do Bush Júnior estava indo para o armário de onde saia o sujeito que incorporava os povos reprimidos do mundo e dos EUA: o novo presidente era negro, com nome árabe, modos gentis e um jeito meio nerd de ser.
De cara, a maioria das pessoas gostou das mudanças. Mas passado o impacto da novidade, os ânimos naturalmente começaram a ficar mais críticos. Mesmo com a retirada das tropas do Iraque, os avanços na política internacional eram pequenos, ao mesmo tempo em que a economia dos EUA teimava em não sair do buraco. E diante de um quadro desses, nem que tivesse o Lula como cabo eleitoral, o Obama conseguiria se reeleger nas eleições que se avizinham.
Ele precisava de algo de impacto; algo que mexesse positivamente com o imaginário popular a ponto de minimizar seu insucesso na condução econômica. A resposta: matar o bicho-papão dos norte-americanos. Daí, foram até a casa do Bin Laden e apagaram ele!
Ora, os fatos que aos poucos vão sendo divulgados evidenciam que a CIA sabia, há muito tempo, exatamente onde o terrorista estava escondido. E por que, então não detonaram com o sujeito antes?
A resposta a isso pode parecer meio estranha. Certo que o Bin era o maior inimigo dos EUA, incorporando as mais temidas ameaças ao país que antes dele era considerado inatacável. Mas lembram das formigas? Lembram da história da queda dos impérios da antiguidade? Pois bem, a derrocada do domínio absoluto das espécies mais ousadas (sejam de formigas ou de gente) aconteceu a partir de variáveis fora do conhecimento dos dominadores até o mortal momento de seu surgimento.
Os insetos não tinham mais nenhum animal que lhes freasse a expansão. Daí a mãe natureza implantou uma planta ou fungo que não tinha como combater;
Os romanos, depois de dizimar qualquer outro exército do mundo conhecido, acabaram vitimados por hordas de desconhecidos e selvagens bárbaros que vinham de algum lugar misterioso do Norte da Europa;
Os Astecas pereceram diante de um punhado de cavalos montados por homens, que eles imaginavam ser uma coisa única.
Dentro dessa ótica, onde os dominadores (gente ou bichos) são derrotados por inimigos que pouco antes não imaginavam existir, voltamos novamente à morte do líder da Al Qaeda. Realmente, o sujeitinho não parecia ser flor que se cheire ou perfume que se use; era um malvadão de primeira linha. Mas ele era uma praga já conhecida, que estava sendo monitorada e relativamente sob controle. Tanto que matar ele foi uma operação muito tranqüila e sem riscos reais.
Entretanto, por mais detestável que possa parecer, essa morte acabou deixando um vácuo; uma lacuna a ser preenchida de contraposição ao domínio absoluto dos EUA. E parece ser regra da natureza: em breve deverá estar surgindo um novo germe dedicado a destruir ou abalar o dominador absoluto. Pode ser que sejam novas células terroristas ainda mais ferozes e destruidoras; ou um país que secretamente se armou até os dentes, ou criou uma nova arma com grande poder de destruição; ou até mesmo uma singela, mas mortal bactéria (como já aconteceu em outros momentos da história da humanidade).
Talvez o tiro nos cornos do Osama seja a garantia de reeleição do Obama. Mas que fique claro: o inimigo controlado e monitorado foi trocado por um novo inimigo, ainda desconhecido e que tem o elemento surpresa da primeira aparição ao seu favor.
Parece que esse foi um mau negócio para a civilização...

Eduardo S. Starosta